::Sambada::
Era uma noite de sambada. O terreiro estava em festa. A noite caminhava e o primeiro ônibus, lotado, trazia os participantes. O casal se aproximou. Ele, cambaleante. Ela, com uma blusa vermelha, boné na cabeça. Denunciava alguns anos a menos que seu companheiro.
Isso é maneira de chegar para brincar, Oswaldo? A moça emenda: Eu disse pra ele que vinha, mas não ia ficar de travesseiro dele, que ele dissesse logo se podia. Oswaldo engata conversa com a conhecida que o repreendera, a filha da professora. Lembram das canetadas e beliscões. Professorinha braba.
Mas Maria, a companheira, prefere falar sobre sua vida. Eu tenho dois filhos e mãe doente. Meu filho tem 14 anos, a menina tem treze. Não posso cuidar do Oswaldo o tempo todo. Muita gente quer ajudar, mas ele não larga a pitú.
Oswaldo levanta a camisa. Mostra as marcas das três facadas que levou. Diz que vai ter revanche. Maria quer esquecer, manda ele baixar a camisa, pra que mostrar? Ela diz que o ajuda, que arruma o quartinho onde ele mora.
Chamaram ele pra ser bandeirista. Uns três grupos já. Mas ele não pode. Oswaldo mostra a cicatriz na barriga, operação de qualquer coisa grave.
Maria fala do fotógrafo que retratou seu trabalho: enquanto ela debulhava feijões e abacaxis, sentindo-se feia para fotos, o homem baixinho e gordinho apontava a câmera na direção de sua barraca, de sua mesa, de suas mãos.
Ela reclama: não gosta de estar só na festa, não conhece ninguém ali. Também ela brinca, mas é novata, além de ser de outro grupo. Oswaldo pede um cigarro.
Quando o terceiro ônibus chega, Maria o convence a voltar pra casa. Eles vão. A mesma Maria cuidando das cicatrizes do Oswaldo.
Ele diz que me ama, e se cuidar, me terá pra sempre. Mas tem que cuidar, né?
E os dois sobem no ônibus vazio.